Escola Industrial e Comercial 1º Maio (antiga Escola Técnica de Quelimane)
Quelimane, Zambézia, Moçambique
Equipamentos e infraestruturas
No início dos anos 50, com a reforma do ensino técnico-profissional, em 1947, é iniciada em Moçambique uma forte procura deste grau de ensino que conduz à urgência da construção de novos edifícios destinados ao seu acolhimento. São então criadas a “Escola Industrial e Comercial da Beira” (1956) – projecto do Gabinete de Urbanização do Ultramar – e as “Escolas Técnicas” de Nampula (1959), Quelimane (1960) e Inhambane (1960), projectadas no quadro do programa de Fernando Mesquita (1916, Vila Real-1990s, Maputo), no contexto dos Serviços de Obras Públicas de Moçambique (ver entrada “Escola Técnica Elementar de Lourenço Marques”).
Se nas escolas primárias do programa Mesquitano, a sala de aula era considerada o elemento base da evolução tipológica, as escolas técnicas desenvolveram-se a partir do conjunto de salas de aula a que chamamos pavilhão. Estes, integrando as diferentes necessidades programáticas, distribuem-se como núcleos funcionais autónomos, ao longo da galeria de circulação principal que os articula perpendicularmente.
As três escolas técnicas construídas apresentam a mais clara organização do programa escolar de Fernando Mesquita. Todas elas, atravessando praticamente a totalidade do lote onde se inserem e com o rigor da orientação Norte-Sul, afluem com a sua galeria coberta até à via pública através de uma entrada desenhada com cuidada integração e continuidade urbana. Para isso a galeria alcança o comprimento que para tal tiver de adquirir e a adaptação do seu remate final à direcção da rua será uma particularidade formal que estará quase sempre presente. Ao contrário das escolas primárias, a galeria principal apresenta-se totalmente livre de obstáculos, assumindo na sua plenitude a sua função distribuidora e uma continuidade visual absoluta. Ao longo dela distribui-se criteriosamente o programa, em pavilhões perpendicularmente autónomos, continuadamente ligados a ela por galerias cobertas de circulação.
Este sistema é resultado de duas questões de importância primordial. Por um lado, constituindo um meio de protecção seguro contra os efeitos da radiação solar, dos ventos e da chuva, é o resultado directo de uma concepção arquitectónica que tem como principal princípio responder de modo eficiente aos desafios colocados a nível do desempenho climático. Por outro lado, permite simultaneamente, com uma racionalidade e funcionalidade rigorosas, a economia dos percursos.
À galeria de circulação principal conectam-se perpendicularmente três pavilhões de cada lado: do lado Nascente, dois pavilhões de ensino em classe e um pavilhão que integra a Mocidade Portuguesa e o ginásio; do lado Poente, dois pavilhões destinados ao ensino experimental e um pavilhão que inclui todo o sector administrativo. A encabeçar a galeria, no topo Norte, estão o canto coral e a cantina da escola.
A construção em piso único é mantida em todo o programa à excepção dos pavilhões destinados às salas de aula de ensino em classe que, por necessidades de dimensionamento, atingem os dois ou três pisos (dois no caso da Escola Técnica de Quelimane). Estes corpos são constituídos por seis salas de aula e instalações sanitárias para ambos os sexos junto aos núcleos de acesso vertical que se encontram sempre na extremidade dos pavilhões. Em algumas situações apresentam também gabinetes para o contínuo e para armazenamento de material.
De um só piso e de dimensões mais generosas, os pavilhões de ensino experimental, por vezes intitulados de laboratórios ou oficinas, estavam destinados aos trabalhos manuais, ao desenho, lavores ou outras actividades. Com a volatilidade que marcava o ensino e o programa a que cada escola se destinava, estes pavilhões foram expressamente projectados com vista a satisfazerem toda a possível variedade de utilizações e frequências que o futuro delas pudesse exigir, tendo sido dimensionadas para o tipo de apetrechamento que exigisse mais espaço. Variando entre as três e as quatro salas por pavilhão, as escolas analisadas possuem entre um a três blocos destinados a esta função, sendo o conjunto formado por duas unidades de três salas, a situação mais comum, como é o caso da Escola Técnica de Quelimane.
Nas Escolas Técnicas – com a excepção da de Lourenço Marques – e nos projectos dos Liceus, o pavilhão destinado ao sector administrativo apresenta proporções significativamente menores do que a maioria dos pavilhões destinados ao restante programa. Inclui uma secretaria com balcão de atendimento ao público virado directamente para a galeria de circulação, um arquivo, um gabinete médico com as respectivas instalações sanitárias, um gabinete para o director, outro para o subdirector e uma sala de professores. Em todo o programa Mesquitano, este é sempre o único edifício em que a distribuição funcional não apresenta como princípio o enquadramento dos seus compartimentos entre fachadas opostas, distribuídos ao longo de uma galeria de circulação exterior coberta. Pelo contrário, a distribuição das várias funções administrativas organiza-se, nos pavilhões administrativos, em torno de um corredor de circulação interno. Terá sido um caso em que os requisitos de acessibilidade restrita ao pessoal docente se terão sobreposto às contingências da exposição solar e às necessidades de ventilação natural, ou talvez tenha constituído uma função que, perante as condicionantes económicas, tenha assumido como preocupação fundamental a racionalização do espaço.
Nas Escolas Técnicas, o sector desportivo não tinha ainda direito à existência de um edifício independente, pelo que a Mocidade partilhava este espaço com o ginásio. A mocidade era repartida entre sexo masculino e feminino, cada um com sala de leitura, sala de jogos e depósito de material desportivo.
Relativamente à concepção arquitectónica em função das características climáticas, as escolas construídas em Quelimane representam, no programa de Fernando Mesquita, o paradigma da perfeita coerência dos sistemas de promoção da protecção da radiação solar e da chuva e a potencialização ao máximo da movimentação do ar como combate aos malefícios da humidade: o rigor da orientação Este-Oeste nas fachadas de maior desenvolvimento é cumprido, protegendo ao máximo do Sol as fachadas de maior desenvolvimento. Complementarmente à implantação, os vãos das fachadas Norte – onde os raios incidem a maior parte do dia e verticalmente – assumem proporções reduzidas e encontram-se devidamente protegidos por dispositivos de sombreamento horizontal: as galerias de circulação coberta que acompanham rigorosamente os pavilhões a Norte, e as próprias coberturas, desempenham na perfeição a função de sombreamento, durante todo o ano. Nas fachadas Sul – onde os raios incidem horizontalmente e apenas no início e no fim de alguns dias do ano – os vãos adquirem maiores dimensões e estão devidamente protegidos por dispositivos de sombreamento verticais, em continuidade com a estrutura, não permitindo, nem nos dias mais quentes do ano, a entrada de qualquer radiação solar directa no interior das salas de aula.
A ventilação cruzada, essencial à renovação do ar do interior das salas de aula, é garantida pela inexistência de obstáculos à sua livre circulação. Totalmente abertas entre fachadas opostas, com vãos em contacto directo com o exterior, mesmo uma brisa pouco significativa de 0.45 m/s permitirá renovar o volume de ar cinco vezes por minuto, expulsando os micróbios. Mas é também, mais uma vez, a correcta implantação da escola que garante a qualidade da ventilação natural: as fachadas onde se encontram os vãos de maior dimensão estão viradas a Sul, permitindo a entrada dos ventos predominantes, que na estação quente, vêm do Sul, em Quelimane. Esta é também a condição ideal para a protecção das chuvas, uma vez que os vãos de maior dimensão se encontram na fachada oposta à da galeria de circulação coberta, garantindo a circulação protegida dos utilizadores em dias de chuva.
Tanto a ventilação como a iluminação natural são ainda beneficiadas com o recuso às janelas beta, um tipo de caixilharia constituído por um sistema de persianas de vidro orientáveis. Permitindo simultaneamente a orientação da luz natural e da direcção do ar para o nível dos utilizadores e do plano de trabalho, garante a ventilação natural permanente da sala de aula, mesmo sob a acção das chuvas. As salas foram concebidas para estar completa e permanentemente abertas a maior parte do tempo: as janelas beta, ao longo de grandes vãos, substituem o hermetismo do caixilho tradicional, permitindo a franca circulação do ar, essencial ao combate da humidade, não apenas para o conforto dos utilizadores, mas também para o impedimento da criação de patologias e a consequente destruição dos materiais. Como uma pequena membrana, este sistema retira às paredes a sua relevância, permitindo encerrar o espaço sem bloquear a entrada do ar. Assumindo a versatilidade de responder às diversas situações que possam surgir, desempenha um sistema integrado e conjugado dos diversos factores: iluminação, ventilação e visibilidade para o exterior.
Zara Ferreira
(Referência FCT: PTDC/AUR-AQI/103229/2008)
optimo. MA
Igreja de Nossa Senhora do Livramento
Quelimane, Zambézia, Moçambique
Arquitetura religiosa
Foi edificada a mando do governador e capitão-general Baltazar Pereira do Lago, em 1776. Interrompida a construção por sua morte, foi retomada e acabada em 1786, por iniciativa do governador António Manoel de Melo e Castro, conforme lápide no interior do templo. De matriz paroquial passou a Sé Catedral, em 1954, com a criação da diocese de Quelimane. A construção de nova catedral, finalizada em 1974, acarretou o abandono da “velha” Sé. Abandono que foi ao ponto de deixar desaparecer retábulos de talha indo-portuguesa e imagens setecentistas de madeira policroma. O edifício, retomando o código maneirista, não deixa de manifestar as reminiscências indo-portuguesas omnipresentes nas poucas expressões arquitetónicas setecentistas em Moçambique e até em Angola, o que explica que esta igreja tenha sido comparada à Ermida de Nossa Senhora da Nazaré, de Luanda (1664), e à de Nossa Senhora do Pópulo, em Benguela (1748). A indigência arquitetónica que seria a de Quelimane até finais do século XIX, terá dotado a Igreja de Nossa Senhora do Livramento com o estatuto do mais importante testemunho edificado da multissecular presença portuguesa no Vale do Zambeze. Com duas torres na frontaria, rematadas por cúpulas, e um frontão central curvilíneo e ornado, mostra uma pequena mas graciosa escala, estando de fachada virada ao mar. Lateralmente, inclui galerias cobertas térreas, ao modo das igrejas da Índia.
José Manuel Fernandes, José Capela
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